O que leva um jovem (18 anos) a escolher o crime como
caminho de vida? Causou-me espanto ver no jornal a notícia de um jovem que
anunciou sua morte em seu Facebook 26 dias antes de ser assassinado a bala. “Antes
de eu morrer eu desejo a meus amigos um grande abraço! Muitas felicidades pra
vocês”.
O jovem Fabrício Batista, de 18 anos, tinha escolhido o
crime como caminho de vida. Respondia por lesão corporal, tentativa de
furto, ameaça e tráfico de drogas. De acordo com a Polícia, Fabrício havia sido
apreendido pela primeira vez aos 15 anos, quando fez ameaças a avó e a
mãe.
Era comum usar em seu perfil no Facebook mensagens fazendo
apologia ao crime e às drogas. Mas, no episódio de sua morte ele se superou. No
dia 4 de março passado, 26 dias antes de vir a falecer, Fabrício deu uma de
profeta e se despediu no Face.
Morreu na última segunda-feira (30/03/15), no Hospital
Regional do Cariri (Juazeiro do Norte), quatro dias após
ser baleado em um bar da cidade. O adolescente estava com
colegas em um bar quando dois homens em uma moto se aproximaram e dispararam
contra as costas e a perna dele. Não resistiu aos
ferimentos.
UMA DOENÇA
SOCIAL?
Claro que no caso de Fabrício, que havia escolhido viver no
crime, há uma explicação direta e bem plausível para sua despedida e morte. Ele
sabia que estava condenado e que sua execução era questão de dias. Aceitou o
destino. Despediu-se, e 26 dias depois, foi brutalmente executado.
Escolher o crime, ou uma forma de vida violenta, tem sido a
opção de muitos jovens pelo mundo, ainda que eles não tenham (e nem revelem)
qualquer indício da ridícula teoria antropológica lombrosiana (Cesare Lombroso),
mas não deixam de apresentar sintomas das teorias de Émile Durkheim, Lacassagne, Gabriel Tarde, Platão,
Aristóteles, São Tomás de Aquino e Thomas Morum.
É extensa a lista de adolescentes que aderem ao terrorismo
do grupo ESTADO ISLÂMICO. Também é cada vez maior o número de jovens da classe
média que ingressam no crime ou que fazem apologia ao crime e as drogas.
É nossa sociedade
que está doente? Durkheim dizia que, na realidade, a tipologia dos crimes evolui no mesmo sentido da evolução social, o
que quer dizer que, em certa medida, o crime é produzido pela sociedade, em
termos abstratos, e praticado, em concreto, por um determinado membro da
sociedade que não aderiu à ordem social.
O fato de o homem
não viver num ambiente de eleição, mas sujeito a uma ordem «imposta», permite a
Durkheim formular a sua concepção da anomia e estabelecer as condições da
produção do crime.
Com efeito, um dos
postulados definidos ao longo da sua obra foi o da necessária integração social do indivíduo que revela
uma maior tendência para a prática de certas «patologias» sociais, como o
suicídio e o crime, quando desinserido do grupo social a que pertence.
No mesmo caminho de Émile Durkheim, Lacassagne aportou o
meio social como causa do crime. Gabriel Tarde preferiu teorizar o
crime pelo princípio da imitação,
o que, para ele, se explicaria segundo três leis: a imitação
funcionaria em razão direta da proximidade social; a imitação
funcionaria no sentido das classes mais baixas para as mais elevadas,
quando existisse conflito entre dois modelos contrários de comportamento, um
poderia substituir outro.
Platão preferiu ver
o o crime como uma doença cujas
causas derivavam das paixões, da procura de prazer e da ignorância),
enquanto Aristóteles apontava que a causa
do crime tinha origem na miséria (Tratado da Política) e
que o criminoso era um «inimigo» da sociedade que deveria ser castigado (Ética
a Nicômaco), do mesmo modo que
enxergou São Tomás de Aquino - a
origem do crime e a miséria. Thomas Morum, por fim, viu o crime como
resultante de causas sociais.
Há muitas teorias. A maioria aponta que o crime tem sua
origem nas causas sociais, absorvendo, é claro, as características da sociedade
em seu momento evolutivo. Daí, a morte anunciada em uma mídia social importante
como o Facebook.
O CRIME É
UM MAL SOCIAL INDISSOCIÁVEL
Na linha do conter a criminalidade - punindo os delinquentes
ou buscando o combate às causas sociais - a aprovação pela CCJ (Câmara dos
Deputados) da proposta que reduz a maioridade penal de 18 para 16 anos de idade
coloca mais lenha na fogueira da polêmica.
É certo que nada ainda mudou e precisa muito ainda para
mudar. Só depois de ser votada duas vezes no Plenário da Câmara e de passar
pelo Senado, também em dois turnos, é que a proposta poderá virar lei. E veja
que a tramitação da PEC ainda pode ser questionada no STF.
O fato é que há uma carga conceitual por trás de tudo, uma
questão que se arrasta por anos. Defrontam-se a maioria dos parlamentares e a
maioria do povo brasileiro (92,7%, conforme pesquisa CNT/MDA) contra alguns
partidos e entidades de classe, como a OAB.
Caso a proposta seja aprovada e promulgada pelo Congresso,
jovens de 16 e 17 anos de idade poderão responder e ser punidos criminalmente
da mesma forma que adultos, seguindo o Código Penal, e não mais seguindo as
normas do ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente).
Os argumentos de um lado e do outro têm ponderável robustez.
Os contra são contra visceralmente. Os a favor justificam que estão apenas
capando uma parte do que estabelece hoje a lei (2 anos), como o faz a grande
maioria dos países desenvolvidos ou emergentes como o Brasil.
O presidente da OAB-CE, Valdetário Monteiro, disse qe a
questão da violência não será resolvido com lei, mas com a presença do Estado
enquanto garantidor dos direitos básicos do cidadão.
Doutor em sociologia e professor do Laboratório de Estudos
da Violência (LEV) da Universidade Federal do Ceará (UFC), Luiz Fábio Paiva
afirma que “não se avalia um sistema de justiça criminal apenas pela qualidade
de suas penas, mas pela qualidade de sua eficácia”. Para ele, além de discutir
o sistema de medidas socioeducativas, o Estado brasileiro precisa reconhecer e
debater a falência dessas políticas.
Paiva avalia que a necessidade de análises é necessária “não
porque os jovens cometem crimes, mas porque os governos não cumprem seu papel
em nenhuma das suas instâncias de atuação”.
As análises dos contra seguem a mesma direção. É inegável
que o governo não cumpre o seu papel. O crime organizado que enfrenta o aparato
policial estatal no Rio de Janeiro é exemplo disso. Mas se parasse aí não
haveria o exemplo de outros países com estados mais eficientes e lei mais rigorosas
do que as que agora estão sendo propostas no Brasil, para controlar o crime.
Não se está abolindo a lei que protege o menor e o
adolescente, mas só cortando um pequeno pedaço dela. Certamente, não será uma panaceia,
mas se forem agregadas outras mudanças que impliquem no endurecimento das leis
contra a impunidade, um grande passo será dado.