Poucas pessoas que propagam opiniões em textos, nem sempre claros e objetivos e, sobretudo, escorreitos, trazem novas e criativas ideias. Gastam, e até rebuscam, verbos em redações enfadonhas de temas repetidos, colocados por manipuladores na busca incessante de produzir opinião e o consequente o conflito desejado (2). São meras imitações. Não que imitação seja um exercício condenável. Ao contrário, Gabriel Tarde(3) dizia que o fenômeno social tem sua base mais importante na imitação. Ele analisa o processo de formação de opinião a partir das relações entre os indivíduos. Se dá mais ou menos do seguinte modo: os meios e sistemas de comunicação e publicidade, vocalizadores e outros mídias distribuem informações, que são captadas pelos indivíduos, que as testa e as repassa, à medida em que haja coincidência de ideias, processo que se repete em ponto infinito, formando os chamados fluxos de opinamento. Uns morrem, enquanto outros seguem e até assumem amplitude virótica, como percebemos nos diversos meios todos os dias, quase sempre de forma ‘inocentemente’ manipulada.

Tarde vai mais adiante na análise da opinião. Aporta que há três tipos de indivíduos: os "loucos" (ou criativos), que iniciam fluxos de opinamento; os "tímidos" ou "sonâmbulos", que são repassadores de fluxos, ou imitadores, na expressão do autor francês; e os "tolos", ou "descrentes", que pouco repassam os fluxos recebidos. A invenção, produzida pelos “loucos” ou criativos, considera Tarde, é a fonte do progresso humano: “apenas 1% da população possui recursos criativos”, mas se “houvesse apenas imitação, a sociedade não avançaria”. Só quase uma década depois, quando publicou “The Universal Oposition” (1897), Tarde reconheceu que a oposição, ou conflito – ademais da imitação e da invenção – também desempenha um papel importante na evolução social do ser humano. A imitação se difunde em ondas concêntricas, conforme Tarde. Por esse processo se formam as instituições e a opinião pública. Se um grupo social afirma ideias, outros podem repassá-las por "imitação".

Os meios de comunicação, vamos concluir, são hoje os mais importantes distribuidores de informação e não formadores de opinião, como tantos teimam em apregoar, ainda que reforcem a opinião formada, à medida em que dão conta de fluxos de opinamento em formação sustentada. Desse modo, aceleram em grande velocidade a transformação de tais fluxos em opinião pública. Essa é a lógica da internet e de suas redes, congeminada com a atual diversidade funcional, mesma energia que tonifica as oposições e a mídia engajada, por exemplo, no bombardeio ao governo Bolsonaro.
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(1) Provérbio que se originou dos passeios de dona Maria I, mãe de D. João VI (avó de D. Pedro I e bisavó de D. Pedro II), que enlouqueceu de um dia para o outro. Declarada incapaz de governar, foi afastada do trono. Passou a viver recolhida e só era vista quando saía para caminhar a pé, escoltada por numerosas damas de companhia. Quando o povo via a rainha levada pelas damas nesse cortejo, costumava comentar: “Lá vai D. Maria com as outras". Atualmente aplica-se a expressão a uma pessoa que não tem opinião e se deixa convencer com a maior facilidade (pag. 145, de “Os ditos sábios – a verdade que o povo consagrou”).

(2) No livro "Les Lois de l'Imitation" (As leis da imitação), publicado em 1890, Gabriel Tarde disse que o que “motiva fundamentalmente o indivíduo são a crença e o desejo”. Diz o autor que ao longo da história foram as “invenções humanas que forneceram os instrumentos de que a crença e o desejo tiveram necessidade. O gênio inventivo individual foi o motor maior da evolução, mas a sociedade, esta não aparece senão graças à IMITAÇÃO, fator primeiro e decisivo da aparição do liame social entre os indivíduos, embora não exclusivo”.

(3) Gabriel Tarde (1843-1904) foi um sociólogo, criminologista e psicólogo social nascido na França. Sua maior contribuição foi feita no campo da sociologia, que ele concebeu como algo baseado em pequenas interações psicológicas entre cada pessoa. Por isso é considerado o pai da microssociologia (e da micropolítica). As forças fundamentais que produziriam essas interações seriam imitação e inovação, que são abordadas com propriedade em um dos seus livros mais importantes, "Les Lois de l'Imitation" (As leis da imitação) publicado em 1890. Outra publicação importante de Tarde foi “L'opinion et la foule” (A opinião e as massas), Paris, PUF, 1989.