O governista Mauro Filho, deputado estadual do Pros, retumbou contra a possível publicação da súmula vinculante 69, do Supremo Tribunal Federal (STF), anulando as leis estaduais de incentivos fiscais em vigor nos estados das regiões Nordeste, Centro Oeste e Norte do Brasil. O pior é que o Ministério Público Federal já deu parecer favorável à edição da súmula e o RISCO EXISTE, SIM.

Em verdade, a guerra de incentivos fiscais tomou conta dessas três regiões anabolizada pela retórica das desigualdades regionais e da geração de emprego e renda. Estava – e ainda está – na ponta da língua que “62% do Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro são concentrados no Sul e Sudeste”. Era mais que justo, portanto, que para gerar a competitividade entre as regiões, os demais estados passassem a oferecer incentivos para que as indústrias se instalassem em seus municípios.

Lembro até da euforia do ex-secretário Raimundo Viana, contando as indústrias que se instalavam no Ceará. Parecia um gincana entre os estados do Nordeste, principalmente. E aí, valia tudo. Nunca ouvir qualquer preocupação com algo parecido com transferência de tecnologia, quebradeira das empresas da região ou qualquer questionamento quanto ao que aconteceria com o pessoal empregado e com a economia da região quando chegassem ao fim os fartos e fáceis incentivos fiscais. Houve de tudo, até calote. Antônio Balmann, hoje é deputado do Pros, mas foi responsável por um cano dos coreanos (da Yamacon, se não me engano) aos cofres do Ceará. Os galpões ainda estão ali região de Acarape/Redenção para provar (agora, parecem, foram repassados para a Unilab).

O fato é que, com rara exceção, só vieram para o Ceará indústrias que haviam perdido a competitividade nos estados do sul e sudeste e viviam dificuldades. Ora, com o perdão fiscal de mais de 17% (ICMS), as ditas indústrias instalaram em diversas regiões do Ceará os seus contêineres e voltaram a ser lucrativas. A cada renovação de incentivo, contudo, a ameaça de retirar os contêineres. Já se passaram mais de 20 anos e o que mudou? Nada. Continuamos com pobreza extrema e o Ceará tem 3,8 milhões (44,6%) de pessoas sobrevivendo com a ajuda do Bolsa Família. Melhor dizendo, piorou.


No interior, principalmente, nos tornamos dependente do crack e das indústrias contêineres. O pessoal do interior desaprendeu (ou não mais aprendeu) a viver do campo, da agricultura de subsistência, e foi viver nas cidades, sem ter (ou estar) aprendido nada. Em Sobral, por exemplo, se a oportunista Grendene – tão pródiga em oferecer aviões particulares ao governador e ágil em construir casas de Punta del Este (Uruguai) – retirar seus contêineres milhares de pessoas viram mendigos urbanos, pois não sabem mais viver da agricultura e tampouco fazer sandálias ou sapatos. Ressalte-se, a bem da verdade, que até os funcionários mais graduados da Grendene (e das outras indústrias também) são trazidos do sul e sudeste. Não há compromisso com a formação.

E se esse dia chegou? O deputado governista Mauro Filho, com baixo espírito público, mas acendrado sentido de interesse particular, afirma que "está em risco o dilaceramento da economia do Norte e Nordeste brasileiro”. E, claro, que todos os estados do Sul e Sudeste estão pressionando para a constituição da dita súmula vinculante que acaba com todos os incentivos fiscais. Vale indagar, por que existe essa desigualdade? Porque o governo federal não cumpre seu papel de trabalhar para reduzir as disparidades. Taí o resultado, ou a falta dele. O deputado tem interesse em defender a continuidade dos incentivos, mas o incentivo fiscal não diminuiu (nesses 20 anos) e nunca diminuirá a desigualdade.


A má herança que resultaria do fim dos incentivos fiscais traria sérias consequências – segundo o deputado, só o Ceará poderia perder 330 mil empregos com carteira assinada. No atual quadro, seria, realmente, uma seca dentro de uma seca. Mas, tenho dito – e repito – que políticas compensatórias nunca produziram desenvolvimento, crescimento. Não seria hora de pegar esses oportunistas empresários, que multiplicaram suas fortunas explorando a mão de obra barata e a renúncia fiscal de um estado pobre, para assumirem, não um compromisso de chantagem, mas um compromisso real, criando, por exemplo, um fundo de desenvolvimento de tecnologia (que não entreguem à CGDT, pelo amor de Deus)? Não seria uma panaceia, mas representaria um alento.